Por José Alves Trigo
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F: Divulgação |
A determinação do Pentágono, nos Estados Unidos, obrigando os jornalistas a apresentarem as informações antes destas serem publicadas é uma afronta ao exercício da profissão por não atender a uma das premissas basilares da função jornalística, que é a independência do exercício da profissão.
Em tese pode-se discutir que segredos militares, que coloquem em risco a defesa ou planos da nação, poderiam ter sua divulgação questionada ou controlada. Mas mesmo nesse caso essa proibição é questionável, pois o compromisso da imprensa não é com o governo americano (nem com o brasileiro) e sim com a sociedade. Vamos imaginar que, em tese o governo americano estivesse interessado em invadir outro país. A imprensa americana teria a obrigação de divulgar mesmo que contrariasse os interesses nacionais.
Trata-se uma luta, aberta, do governo americano contra o que ele chama de “imprensa tradicional”, os grandes conglomerados, e não inclui as redes sociais. O grande prejudicado com essa luta são as liberdades democráticas e o exercício da profissão. E o mais estranho é que isso ocorra em uma nação que sempre se orgulhou de defender a liberdade de expressão, manifestada na sua Primeira Emenda. Censurar as informações é uma atitude que tem se registrado apenas em nações autoritárias.
A medida, que ameaça os jornalistas com a "suspensão imediata" caso haja publicação de “informações não confidenciais controladas", é mais um passo no endurecimento na relação imprensa-governo, que não precisa ter uma natureza pacífica, mas dentro dos princípios de justiça e da lei. O escritor Millor Fernandes já defendia que “Jornalismo é oposição. O resto é armazém de secos e molhados”.
A Fundação Freedom of the Press Foundation questionou a exigência e anunciou que o governo está legalmente proibido de exigir que jornalistas abram mão de seu direito de investigar o governo em troca de acesso ou credenciais.
A restrição do acesso ao Pentágono faz parte de uma série de atitudes tomadas pelo governo americano contra a imprensa.
Ainda neste mês anunciou um processo de US$ 15 bilhões (cerca de R$ 79 bilhões) contra o jornal The New York Times, por difamação e calúnia. A tentativa foi barrada na Justiça.
Após o assassinato do ativista conservador Charlie Kir a rede de televisão ABC suspendeu o programa do comediante Jimmy Kimmel. O comediante acusou o governo republicano de tentar tirar proveito político da morte do influencer. Kimmel já voltou à atividade.
No começo do ano o governo retirou a Associated Press do grupo de imprensa da Casa Branca, o que impede jornalistas da agência de acessar o Salão Oval, o Air Force One e outros eventos restritos. A agência de notícias se recusou a usar o nome “Golfo da América em lugar de “Golfo do México”, como a região é tradicionalmente conhecida.
Além disso, a Comissão Federal de Comunicações (FCC), órgão que regula as comunicações, tem sido mencionada em investigações e pressões, especialmente sobre redes de televisão. Nos Estados Unidos, assim como Brasil, as emissoras de televisão são concessões do governo federal e estas podem ser revogadas.
Ou seja, a imprensa americana enfrenta graves embates, mas a história tem mostrado que nesse tipo de luta os governos quase sempre perdem.
José Alves Trigo é professor do Centro de Comunicação e Letras (CCL) da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM)
*O conteúdo dos artigos assinados não representa necessariamente a opinião do Mackenzie.
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